Reabertura do Refis exige atenção das empresas
O foco centra-se nos débitos que não estejam nem tenham sido parcelados até o dia 9 de outubro de 2013.
Em 10 de outubro de 2013 foi publicada a Lei 12.865, originada a partir da conversão da Medida Provisória 615/2013. Dentre as diversas mudanças na legislação tributária, cabe registrar que reabriu até o dia 31 de dezembro de 2013 o prazo do Refis IV, instituído pela Lei 11.941/2009 para as dívidas vencidas até 30 de novembro de 2008 (cf. art. 17). O foco centra-se nos débitos que não estejam nem tenham sido parcelados até o dia 9 de outubro de 2013. A opção excepcional de pagamento ou parcelamento não se aplica aos débitos que já tenham sido parcelados nos termos da Lei 11.941/09. Também não se aplica aos débitos posteriores ao período estipulado (a partir de 1º de dezembro de 2008 inclusive).
Segundo o artigo 2º, parágrafo 1º, da Portaria Conjunta PGFN/RFB 7, publicada em 18 de outubro de 2013, poderão ser pagos ou parcelados os débitos de pessoas físicas ou jurídicas, consolidados por sujeito passivo, constituídos ou não, com exigibilidade suspensa ou não, inscritos ou não em Dívida Ativa da União, mesmo que em fase de execução fiscal já ajuizada, considerados isoladamente: a) os débitos, no âmbito da PGFN e da RFB, decorrentes do aproveitamento indevido de créditos do IPI oriundos da aquisição de matérias-primas, material de embalagem e produtos intermediários relacionados na TIPI com incidência de alíquota zero ou não-tributados; b) os débitos, no âmbito da PGFN e da RFB, decorrentes das contribuições sociais previstas nas alíneas “a”, “b” e “c” do parágrafo único do artigo 11 da Lei 8.212/1991, das contribuições instituídas a título de substituição e das contribuições devidas a terceiros, assim entendidas outras entidades e fundos; c) os demais débitos administrados pela PGFN e pela RFB; e d) os débitos de COFINS das sociedades civis de prestação de serviços profissionais, relativos ao exercício de profissão legalmente regulamentada a que se referia o Decreto-Lei 2.397/1987, revogado pela Lei 9.430/1996. Não estão contemplados os débitos apurados na forma do Simples Nacional de que trata a Lei Complementar 123/06.
O artigo 3º da referida portaria dispõe sobre as reduções e as quantidades de prestações, variando desde o pagamento à vista, com redução de 100% das multas de mora e de ofício, 100% sobre o valor do encargo legal, 45% dos juros de mora e 40% das multas isoladas, até o parcelamento em 180 prestações mensais e sucessivas, com redução de 60% das multas de mora e de ofício, 100% sobre o valor do encargo legal, 25% dos juros de mora e 20% das multas isoladas.
O contribuinte deve calcular e recolher mensalmente parcela equivalente ao maior valor entre: R$ 2.000,00 no caso de parcelamento de débitos decorrentes do aproveitamento indevido de créditos do IPI, R$ 50,00 no caso de pessoa física e R$ 100,00 no caso dos demais débitos de pessoa jurídica; ou o montante dos débitos objeto do parcelamento dividido pelo número de prestações pretendidas (cf. art. 17, § 2º, da Lei nº 12.865/13 c/c o art. 4º da Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 7/13).
Por ocasião da consolidação, será exigida a regularidade de todas as prestações devidas desde o mês de adesão até o mês anterior ao da conclusão da consolidação dos débitos parcelados. A partir do mês subsequente ao da consolidação até o mês anterior ao do pagamento o valor de cada prestação será acrescido da taxa Selic e de 1% para o mês de pagamento.
O Capítulo II da referida portaria disciplina o pagamento à vista ou o parcelamento de saldo remanescente do programa Refis e dos parcelamentos PAES, PAEX, Ordinários e Simplificados (cf. arts. 5º ao 12).
O Capítulo III cuida das disposições comuns e se divide em dez seções, a saber: I — Do pedido de parcelamento e do pagamento à vista com utilização de prejuízos fiscais e bases negativas da CSLL, II — Dos débitos em discussão administrativa ou judicial, III — Da consolidação, IV — Da antecipação de prestações, V — Das competências, VI — da rescisão do parcelamento, VII — Do recurso administrativo, VIII — Da liquidação de multas e juros com créditos decorrentes de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa de CSLL, IX — Da possibilidade de parcelamento de débitos da pessoa jurídica pela pessoa física; X — Dos códigos para parcelamento ou pagamento.
O Capítulo IV trata das disposições finais. Dentre elas, merece destaque o artigo 31, que cuida da conversão de depósitos em renda ou transformação em pagamento definitivo. Os percentuais de redução serão aplicados sobre o valor do débito atualizado à época do depósito e somente incidirão sobre o valor das multas de mora e de ofício, das multas isoladas, dos juros de mora e do encargo legal efetivamente depositados.
Essa regra espanca dúvida que foi suscitada na aplicação da Lei 11.941/2009 e suas sucessivas regulamentações. Como decorrência de divergência interpretativa, restou consagrado no âmbito do STJ a impossibilidade de devolução da diferença entre os juros que remuneram o depósito judicial e os juros de mora do crédito tributário que não foram objeto de remissão mediante aproveitamento do benefício mediante a transformação em pagamento definitivo (conversão em renda) de depósito judicial vinculado a ação já transitada em julgado (cf. REsp. 1.251.513, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 10.08.2011, DJe 17.08.2011). Recentemente, os embargos de declaração que foram opostos tanto pela Fazenda Nacional como também pelo contribuinte foram rejeitados (cf. RESp. 1.251.513-ED, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, j. 11.09.2013, DJe 17.10.2013).
A conversão em renda ou transformação em pagamento definitivo dos valores depositados somente ocorrerá após a aplicação dos percentuais de redução na forma estabelecida. Em seguida, o sujeito passivo poderá requerer o levantamento do saldo remanescente, se houver. Nessa hipótese, o saldo remanescente somente poderá ser levantado pelo sujeito passivo após a confirmação pela RFB dos montantes de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL.
Em suma, as vicissitudes que se seguiram nas regulamentações da Lei nº 11.941/09 acabou por torná-la menos atrativa. A intenção declarada dos funcionários de primeiro escalão (no sentido de efetivamente promover ajuda para que as empresas pudessem limpar o passivo tributário em razão da crise econômica mundial originada em 2008) nunca se alinhou com a intenção dos funcionários mais subalternos (no sentido de restringir algumas possibilidades inicialmente prometidas na lei). A consolidação tardou e foi disponibilizada com muitos defeitos e lacunas que, por vezes, demandaram verdadeiras lides incidentais em torno da interpretação adequada do arcabouço normativo aplicável ao caso concreto.
A possibilidade que ora se reabre, no entanto, pode representar verdadeira oportunidade se levarmos em conta alguns defeitos e problemas que efetivamente ocorreram em situações específicas quando do período de adesão por força da Lei 11.941/2009, seja com a adesão de novos débitos ou com aqueles que (por qualquer motivo) não lograram ser aceitos pelo complexo sistema informático então implementado.
Além de reabrir o prazo do Refis IV até 31 de dezembro de 2013, a Lei 12.865/2013 também criou programas de parcelamento específicos referentes aos débitos para com a Fazenda Nacional: a) relativos à COFINS/PIS, de que trata o Capítulo I da Lei 9.718/1998, devidos por instituições financeiras e companhias seguradoras (art. 39, caput); b) objeto de discussão judicial relativos à não inclusão do ICMS da base de cálculo da COFINS/PIS devidos por qualquer pessoa jurídica (artigo 39, parágrafo 1º); e c) relativos ao IRPJ e à CSLL, decorrentes da aplicação do artigo 74 da MP 2.158-35/01 (artigo 40). Para esses três casos, o pedido de pagamento ou parcelamento deve ser efetuado até 29 de novembro de 2013 e se referem aos débitos vencidos até 31 de dezembro de 2012.
A regulamentação dos dois primeiros programas referidos acima foi publicada em 22 de outubro de 2013 e veiculada na Portaria Conjunta PGFN/RFB 8. Eventual dúvida que poderia haver sobre a conversão em renda dos depósitos efetuados nos processos administrativos e judiciais foi sanada pelos parágrafos do art. 5º, os quais estabelecem que o sujeito passivo requererá a transformação do depósito em pagamento definitivo. As reduções serão aplicadas ao saldo remanescente a ser pago ou parcelado, se houver.
Quanto ao parcelamento de débitos junto à RFB e à PGFN, relativos ao IRPJ e à CSLL, decorrentes da aplicação do art. 74 da MP 2.158-35/01, foi regulamentado pela Portaria Conjunta PGFN/RFB nº 9, publicada em 22.10.2013. No caso da opção pelo parcelamento e enquanto não consolidado, o contribuinte deverá calcular e recolher até 29.11.2013 como 1ª prestação o valor correspondente a 20% da dívida e, mensalmente, a partir da 2ª prestação a parcela equivalente ao montante dos débitos objeto do parcelamento dividido pelo número de prestações restantes, em valor não inferior a R$ 300.000,00.
O Capítulo V (cf. art 6º) dispõe sobre a liquidação de valores correspondentes a multas, de mora ou de ofício, e a juros moratórios, com créditos decorrentes de prejuízo fiscal e base de cálculo negativa da CSLL, próprios e de empresas domiciliadas no Brasil, controladas pela pessoa jurídica em 31.12.2011, desde que continuem sob seu controle até a data da opção pelo parcelamento e não se aplicando o limite de 30% do lucro líquido ajustado, previsto no art. 42 da Lei 8.981/1995 e no artigo 15 da Lei 9.065/1995.
Os parágrafos finais do referido artigo 6º prescrevem o restabelecimento da situação anterior na hipótese de constatação pela RFB de irregularidade quanto aos montantes declarados de prejuízo fiscal ou de base de cálculo negativa da CSLL que implique redução, total ou parcial, dos valores utilizados, com sanções de rescisão do parcelamento no caso de seu descumprimento, bem como a responsabilidade da pessoa jurídica relativamente aos tributos devidos.
Cabe lembrar que na sessão de 10 de abril de 2013 foi proclamado o resultado final do julgamento da ADI 2.588, quando se estabeleceu a interpretação conforme a Constituição ao referido artigo 74, “com eficácia erga omnes e efeito vinculante, no sentido de que não se aplicaria às empresas coligadas localizadas em países sem tributação favorecida (não ‘paraísos fiscais’), e que se aplicaria às empresas controladas localizadas em países de tributação favorecida ou desprovidos de controles societários e fiscais adequados (‘paraísos fiscais’, assim definidos em lei)” (cf. Informativo STF 701). Verifica-se que algumas situações já estão definidas: coligada fora de paraíso fiscal não está alcançada pelo artigo 74; ao contrário, controlada em paraíso fiscal está alcançada pelo artigo 74. O acórdão está pendente de publicação e poderá ser objeto de embargos de declaração pela CNI.
É bom ter presente que esses programas específicos de parcelamento foram instituídos exclusivamente para as empresas que discutem passivo tributário, oriundo de cobranças e autuações fiscais, tanto no âmbito administrativo como também na seara judicial, como ocorre na atual discussão do artigo 74. A lei e o ato regulamentar não se dirigem àquelas empresas que discutem judicialmente possível oportunidade, como se verifica em muitos casos relacionados à não inclusão da parcela do ICMS na base de cálculo da Cofins/PIS.
Cuidando-se dos débitos materializados no passivo, aí sim cabe uma decisão gerencial da empresa, que leve em conta os cálculos na ponta do lápis à luz da regulamentação veiculada pela portaria conjunta referida, bem como a possibilidade de êxito da discussão posta na esfera administrativa ou judicial, especialmente à luz de eventuais especificidades de cada caso concreto em comparação com os paradigmas que aguardam o pronunciamento definitivo do STF sobre o tema em questão.